Final in Últimos Poemas (O mar e os sinos)

Matilde, anos ou dias
dormidos, febris,
aqui ou ali,
cravando,
rompendo a espinha dorsal,
sangrando sangue verdadeiro,
despertando talvez
o perdido, dormido:
camas clínicas, janelas estrangeiras,
vestidos brancos das sigilosas,
o torpor nos pés,

Depois estas viagens
e o meu mar de novo:
tua cabeça na cabeceira,
na luz
tuas mãos voadoras,
na minha luz,
sobre minha terra.

Foi tão belo viver
quando vivias!
O mundo é mais azul
e mais terrestre de noite,
quando durmo,
enorme, dentro de tuas breves mãos.

XVIII in Ainda

Os dias não se descartam nem se somam, são abelhas
que arderam de doçura ou enfureceram
o aguilhão: o certame continua,
vão e vêm as viagens do mel à dor.
Não, não se desfia a rede dos anos: não há rede.
Não caem gota a gota de um rio: não há rio.
O sonho não divide a vida em duas metades,
nem a ação, nem o silêncio, nem a virtude:
a vida foi como uma pedra, um só movimento,
uma única fogueira que reverberou na folhagem,
uma flecha, uma só, lenta ou ativa, um metal
que subiu e desceu queimando-se em teus ossos.

Farewell 5 in Crepusculário

Já não se encantarão meus olhos nos teus olhos,
já não se adoçará junto a ti minha dor.

Mas até onde for levarei o teu olhar
e até onde tu fores levarás minha dor.

Fui teu e foste minha. Mais? Juntos fizemos
um desvio no caminho onde o amor passou.

Fui teu e foste minha. Serás do que te ame,
do que colha no teu horto o que eu plantei.

Eu me vou, estou triste: mas sempre estou triste.
Venho dos teus braços. Não sei aonde vou.

...Deste teu coração diz adeus um menino.
E eu lhe digo adeus.